CIENCIA PSICOPATOLÓGICA Y FORMACIÓN PARA EL PSICÓLOGO
Flavio Roberto de Carvalho Santos
Universidade Veiga de Almeida, Rio de Janeiro/Brasil
Resumo
Pathos é conceituado como o radical que concebe doença na forma original, principalmente na visão psiquiátrica. Estudar o sofrimento da “alma” tem como objeto os desvios da construção da personalidade, onde cada ser se organiza dentro de uma estrutura psíquica. Psicopatologia é o estudo do sofrimento afetivo, onde há uma expressão da grande dificuldade para lidar com a diversidade, flexibilidade e eficácia no uso dos mecanismos internos. O objetivo é discutir a diferença entre transtornos psiquiátricos e personalidade de base para a formação de psicólogo. O método destaca o DSM V e teóricos como Freud, Reich, Navarro, Bergeret e Escribano. A característica principal da psique é o fenômeno emocional, onde o afeto é movido para fora, a expressão afetiva de um conteúdo construído e armazenado ao longo do crescimento e do desenvolvimento. Problemas no desenvolvimento psíquico dificultam o processo, estabelecem um páthos. Psicopatologia, resposta adaptativa, é um sinal, como o estresse é uma Síndrome Geral de Adaptação. O resultado analítico ressalta que o transtorno focado pela psiquiatria demonstra o sujeito que está com determinado sofrimento, enquanto que na psicologia o sujeito é determinada estrutura para um referido sofrimento. Tal diferença para o formando em psicologia demarca sua conduta diferenciada para intervenção no processo psicoterapêutico.
Palavras-chave: Psicopatologia; formação de psicólogo; phátos
Resumen
Pathos es considerado como el radical que concibe la enfermedad en su forma original, especialmente en la visión psiquiátrica. Estudiando el sufrimiento del “alma” tiene por objeto las desviaciones de la construcción de la personalidad, donde cada ser se organiza dentro de una estructura psíquica. La psicopatología es el estudio del sufrimiento emocional, donde hay una expresión de gran dificultad para atender a la diversidad, la flexibilidad y la eficiencia en el uso de los mecanismos internos. El objetivo es discutir la diferencia entre los trastornos psiquiátricos y de personalidad básica para la formación del psicólogo. El método destaca el DSM V y teóricos como Freud, Reich, Navarro, Bergeret y Escribano. La característica principal de la psique es el fenómeno emocional, donde el afecto se mueve hacia fuera, la expresión afectiva de contenidos construido y almacenado durante el crecimiento y el desarrollo. Los problemas en el desarrollo mental dificultan el proceso, establecer un pathos. Psicopatología, respuesta adaptativa es un signo, ya que el estrés es un síndrome general de adaptación. El resultado del análisis pone de manifiesto que el trastorno se centró, la psiquiatría demuestra el tipo que está con especial sufrimiento, mientras que en la psicología del sujeto se da estructura para el sufrimiento. Esta diferencia para el graduado en psicología demarca su comportamiento diferenciado para la intervención en el proceso psicoterapéutico.
Palabras clave: Psicopatología ; formación psicólogo; pathos
Abstract
Pathos is regarded as the radical who conceives disease in its original form, especially in the psychiatric vision. Studying the suffering of the “soul” has as its object the deviations of the construction of personality, where every being is organized within a psychic structure. Psychopathology is the study of emotional suffering, where there is an expression of great difficulty dealing with diversity, flexibility and efficiency in the use of internal mechanisms. The aim is to discuss the difference between psychiatric disorders and basic personality for the psychologist training. The method highlights the DSM V and theorists such as Freud, Reich, Navarro, Bergeret and Escribano. The main feature of the psyche is the emotional phenomenon, where the affection is moved out, the affective expression of content built and stored during growth and development. Problems in mental development hinder the process, establish a pathos. Psychopathology, adaptive response is a sign, as stress is a General Adaptation Syndrome. The analytical result highlights that the disorder focused psychiatry demonstrates the guy who is with particular suffering, while in psychology the subject is given structure for that suffering. This difference for the graduate in psychology demarcates its differentiated conduct for intervention in the psychotherapeutic process.
Keywords: Psychopathology ; psychologist training ; phatos
Introdução
Abordar um tema tão complexo como a psicopatologia é reconhecer inicialmente que há uma dificuldade para se esgotar o assunto. Inicialmente, foi ‘Psychological pathology’ o termo usado para referir a ‘Psicopatologia’, um termo criado pelo filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham, em 1817, ao pensar nas “motivações humanas”, provavelmente por considerar o direito penal como um ramo crucial do direito, em sua particular ligação com “psicologia humana”. Assim, a psicopatologia se refere ao campo dos fenômenos anormais da vida mental (Paim, 1993 apud Angerami-Camon, 2013). Destaca-se que na França, Claude Bernard (1813 – 1879), pela importância da escola psicopatológica francesa, é considerado o nascimento da psicopatologia em seu país por mostrar na fisiologia a continuidade entre os fenômenos normais e patológicos. Também é abordado que foi Esquirol, na França em 1837 e, Griesinger, na Alemanha em 1845, que são considerados os criadores da psicopatologia, como destaca Chenieaux (2012). A psicopatologia é uma ciência, disciplina científica, uma ciência autônoma que estuda a doença mental em vários aspectos. Segundo o autor (Op. Cit.) a ideia de psicopatologia, para Karl Jaspers(1883 - 1969), é que esta estuda o fenômeno psíquico patológico apenas, onde em 1909, insatisfeito com os procedimentos adotados no tratamento de doentes mentais, pesquisa novos rumos para a psiquiatria, apontando a psicopatologia fenomenológica, onde publica em 1913, o compêndio "Psicopatologia Geral", clássico no diagnóstico das doenças mentais e, considerado também, o pai da Psicopatologia.
Esta tentativa e proposta demarcam um esboço e conceito didático das principais psicopatologias com base em autores relevantes na área e que são importantes para a formação da ciência psicológica. Ressalta-se que psicopatologia é o estudo do sofrimento afetivo, de uma expressão da grande dificuldade do sujeito para lidar com a diversidade, flexibilidade e eficácia no uso de diversos mecanismos, sendo esta realidade interna e construída ao longo de uma vida. Para a compreensão deste fenômeno, a valorização do período desenvolvimental desde a vida intrauterina até parte da infância na formação da psique será abordada com grande destaque psicodinâmico, onde teóricos como Freud, Reich, Navarro, Bergeret e Escribano apontam esta etapa da vida como básicas. Tal proposta parece ser um facilitador para a compreensão e intervenção clínica dos profissionais em formação na psicologia. Algumas estruturas de base principais são abordadas como Neuroses, Psiconeurose, Estados Limítrofes e Estados das Psicoses, do ponto de vista histórico psicodinâmico, onde esta teorização, ratificando, parece possibilitar uma visão relativamente completa da estruturação da personalidade. Assim, este trabalho é uma tentativa de fazer uma articulação sobre o tema e sua diferenciação dos transtornos em psiquiatria indicados pelo atual DSM V, diferindo sobre a fenomenologia psicodinâmica da estrutura de personalidade dos sinais e sintomas dos transtornos.
Assim, do ponto de vista da vivência fenomenológica para a psicopatologia, se destaca que:
Quem pretender estudar o psiquismo ligado ao páthos necessita se perguntar sobre os movimentos e alterações desse psiquismo, sobre as suas relações com o mundo e com os outros, as suas manifestações afetivas, perturbações, confusões e desmedidas, as suas maneiras de adoecer, os seus prazeres e sofrimentos e os seus desejos, impulsos, tendências e apetites. (Calderoni, 2009, p.9)
Considerações gerais
Psicopatologia, junção de palavras, deriva de Psico –do grego psyché, a alma, significa borboleta em uma alegoria à imortalidade da alma, pois depois da vida de lagarta transforma-se em pura alegria de viver leve e solta, sendo a alma humana purificada; e Pato –do grego páthos, refere à doença ou sofrimento e, de logia– do grego lógos, referente à palavra, discurso ou tratado, no sentido de estudo. As palavras juntas referem-se ao estudo de um conjunto de sofrimento da alma e têm como objeto os desvios da personalidade, as desordens patológicas da personalidade e do comportamento. Pode-se destacar que cada indivíduo se organiza dentro de uma estrutura psíquica. Neste sentido, alguns pontos naturalmente surgem ligados à psicopatologia, como a etiologia (estudo da causa ou origem), a nosologia (estudo ou tratado explicativo de classificação das doenças), nosografia (descrição das doenças) e a semiologia (estudo dos sinais e os sintomas).
O processo de formação da psique tem inicio na concepção, sendo um processo biopsicológico longo que deve chegar à uma maturação plena em seu processo de vida (Navarro, 1996). A característica principal da psique é o fenômeno emocional, onde o afeto é movido para fora, a expressão afetiva de um conteúdo construído e armazenado ao longo do crescimento e do desenvolvimento. Infelizmente, alguns problemas ocorrem e dificulta este processo que, neste caso, se estabelece um sofrimento, um páthos. Como a função instintiva humana básica é a conservação e preservação da espécie, frente a qualquer dificuldade extremada ou significativa, sempre ocorrerá uma adaptação que pode ser sinalizada pela patologia como resposta inadequada ao fato na tentativa de manter a vida. Do ponto de vista da teoria reichiana, a palavra ‘organismo’ é denominada dinamicamente pela junção somática e psíquica. Então, quando este organismo não consegue lidar com as dificuldades vividas e esgota as “adaptações patológicas” como sinalização de pedido de socorro, este sucumbe, adoece mais gravemente e morre. Uma patologia é uma resposta adaptativa e que é um sinal, assim como o próprio estresse é uma Síndrome Geral de Adaptação, como definido por Selye em 1936 (Moreira e Mello Fº, 1992). Uma grande e importante dificuldade destacada nos casos de psicopatologia é o estresse, valorizado como um agente desde o período primitivo até a vida adulta, o qual o organismo buscará sempre por uma adaptação.
No momento mais primitivo da vida, no período embrionário, Navarro (1996) destaca que o estresse sobre o embrião é o principal desencadeante da emoção (expressão) do medo (emoção básica), um ‘medo’ celular da morte. Situações como estas são vivenciadas nas circunstâncias onde há uma tentativa de aborto, intoxicação, uso de álcool e/ou drogas e todas as outras formas de tensão aguda ou crônica, onde o embrião responderá com uma reação celular básica de contração, uma defesa, tentando se adaptar. Citando Navarro (1996, p. 17): “É preciso assinalar que cada dano é causa de um mecanismo de defesa para a vida, que se manifesta com diversas patologias.” O mesmo pode ser entendido referente ao período fetal. Neste período a psique ainda é fusional e há também a realidade de uma simbiose biológica, assim como no período embrionário. O período fetal tem sua extensão até o décimo dia de nascido segundo a teoria reichiana.
O parto, momento também crucial para o novo ser, este deverá conduzir ao nascimento. Nascer quer dizer que o bebê será conduzido para uma separação (do útero) que deve ser adequada, sem tensões, ansiedades e estresses, para a vivência dos estímulos do contato externo que facilitará para a construção da subjetividade, portanto, da saúde ou, da patologia no caso de neste momento problemas graves ocorrerem. Uma mãe muito ansiosa, estressada ou estressante neste momento pode comprometer essa passagem.
Como já apontado, Navarro (1996) destacou que Reich considera os dez primeiros dias de nascido como um período intra-uteriano e, portanto, o período neonatal é demarcado do 11º dia de nascido ao 8º-9º mês, quando nesta época ocorre o desenvolvimento ósseo e muscular da mandíbula, o processo da maturação nervosa para os movimentos voluntários da mastigação. Por volta desta idade o recém-nascido dá início à motilidade intencional com base na maior mielinização das fibras nervosas. Quando a função materna é insatisfatória continuamente em relação às necessidades simbióticas deste bebê, há a facilitação para a instalação da psicopatologia do Núcleo Psicótico. Esta psicopatologia traz a angústia ou o sentimento de se desmembrar, desmanchar, que expressa o não receber e por isso se perdem, ou não se encontram, em si mesmo.
Após o 8º-9º mês de nascido, tem início o período pós-natal, marcado pelo inicio do processo de desmame e o desmame propriamente dito, por volta do 18º mês. Este período necessita que a função materna favoreça a segurança necessária para o bebê iniciar a busca além dela. As dificuldades vivenciadas aqui favorecem a instalação dos Estados Limítrofes pela inconstância, incoerência, ansiedade e incertezas, ou seja, a possibilidade da falta/perda. Da mesma forma que a precocidade no desmame, a amamentação prolongada também acarreta dificuldades, pois cria ou mantém uma dependência na simbiose biológica não mais necessária neste momento. O período pós-natal é marcado pela maior atuação neuromuscular que marcará a entrada da criança nas relações mais amplas por seu crescente desenvolvimento, definindo sua forma (caráter) de ser e atuar no mundo, uma realidade intra e inter-psíquica. É também marcado pelo desenvolvimento da linguagem, dependendo dos comprometimentos intensos e graves, poderá se instalar, portanto, os Estados Limítrofes. Ressalta-se neste período o início do desenvolvimento para a fase anal, proposta pela psicanálise freudiana, com a construção do EGO (o eu). A analidade, psiquicamente, representará a realidade da condição do controle de si, de seus desejos e vontades assim como a participação no mundo de forma mais ativa, mais pessoal.
A diferenciação da instalação da psiconeurose na fase pós-natal é a entrada na fase fálica, ou seja, ativar Édipo e vivenciá-lo como um complexo e “solucioná-lo” inadequadamente.
A neurose (Navarro, 1996) se instala por problemas emocionais e existenciais vividas após a puberdade, pois não houve comprometimento graves em fases anteriores. Sendo a marca de ansiedades e medos referentes à vida no seu sentido mais simples, nascida de um ambiente cultural ou social restritivo não tão comprometedor. É possível encontrar uma ansiedade ou angústia ligada à sexualidade quanto à entrega ao prazer, somatizações e estresses circunstanciais; contudo, pode ser minimizado com facilidade, ou seja, é uma questão existencial.
Como apontado por Navarro (Op. Cit.) o estresse é a marca principal para a psicopatologia. Assim, quanto mais cedo o estresse ocorre no processo de desenvolvimento, maior o dano na estrutura de um individuo e, consequentemente, acarreta na diferença marcante na forma de lidar com a angústia. Isto explicita exatamente que há um significado do sinal (sintoma) em relação à situação atual, o curso e a origem da psicopatologia.
É possível relacionar o estresse e as psicopatologias da seguinte forma: a estrutura Psicótica é produto de um estresse intra-uterino e provoca a angústia do medo de se desintegrar ou se perder (morrer). A estrutura dos Estados Limítrofes tem marcado o estresse no período neo-natal que acarreta a angústia do medo de não poder sobreviver por faltar algo, é a angústia da expectativa da perda. A Psiconeurose, marcado pelo estresse pós-natal, vive a angústia do medo de não poder viver, pois há a culpa e, o Neurótico, marcado pelo estresse na vida pós-púbere, vive a angústia do medo de uma circunstância ou um momento em que a vida é insatisfatória, ou seja, de não se realizar.
Nesta visão, com base nos estudos de Navarro (1996) acerca da clínica-social, a classificação psicopatológica está distribuída da seguinte forma: Neurose – 4,9%, Psiconeurose – 20%; Estados Limítrofes – 45% e Estados Psicóticos – 30%. Da mesma forma, Bergeret (apud Bukowski, 2006) destaca que parte da população está distribuída em Neurose – 33 ou 20%, Estados Limítrofes – 33 ou 50% e, Psicótico – 33%. Tais dados são importantes para abordar a realidade da sexualidade. Há que se reconhecer que a sexualidade é uma expressão da saúde pela economia sexual e direciona para a manutenção da mesma. Nos casos de psicopatologia, a sexualidade está comprometida e a estase energética da libido sustenta o sofrimento. É exatamente a boa economia da energia sexual, onde a qualidade da vivência afetiva é eficaz, que a saúde se estabelece. Para tanto, há a necessidade de uma estrutura funcional coerente dos sistemas neuropsíquicos expressos na sexualidade.
A ampliação dos estudos e pesquisas das neurociências na atualidade pode facilitar a compreensão das questões referentes à psicopatologia. A valorização das neurociências para esta articulação destaca a realidade histórica dos trabalhos de Freud, especialmente o “Projeto para uma psicologia científica”, de 1895, onde sua tentativa era de compreender os fenômenos psíquicos aliados a achados histológicos e neurofisiológicos (Bergeret, 2006). Da mesma forma, Gay (1989, p. 89) aponta as ideias de Freud, onde:
A mente está sob o domínio do princípio da estabilidade, que ordena que ela descarregue estímulos desestabilizadores que invadem de dentro ou de fora, “é o principio da inércia neurônica”, para usar a formulação técnica de Freud: “os neurônios tendem a se desfazer da Quantidade”. Isso porque o estado quiescente, de calma, após a tempestade, dá prazer, e a mente procura o prazer ou (o que muitas vezes é a mesma coisa) foge à dor. Mas a “fuga ao estimulo” não consegue explicar, por si só, toda a atividade mental: o principio da estabilidade é rompido sucessivamente em vários pontos. (Gay, 1989, p. 89)
E continua:
... seus pacientes haviam-lhe ensinado que, embora muitos sintomas físicos sejam conversões histéricas, alguns revelam realmente uma natureza orgânica. Uma razão importante da grande atração de Freud pela tese de que as neuroses se originam de um mau funcionamento sexual era a de que, “afinal, a sexualidade não é uma questão puramente mental. Ela também tem um lado somático”. Por isso Freud, como disse a Fliess em 1898, não estava “minimamente disposto a deixar o psicológico solto no ar, sem a base orgânica. (Gay, 1989, p. 126)
Como também destacou Pribram e Gill (1976), a experiência do neurologista Freud deixou claro para ele que o cérebro era o instrumento principal de uma organização da função psicológica onde os processos conscientes e inconscientes se distinguem com base em diferentes organizações do sistema nervoso central. Neste apanhado histórico de questões neurais, se observa o termo prazer, que está vinculado à sexualidade e, histeria, uma psicopatologia.
Esta dinâmica é relevante em função de que na atualidade há recursos que podem auxiliar a compreensão do fenômeno humano por várias leituras. Para uma boa compreensão da psicopatologia, é importante a compreensão do entrelaçamento entre a base corporal –neural– com a base psíquica –subjetivo. Uma função psíquica só ocorre porque há uma base neural, é o corpo respaldando o subjetivo, isso é uma unidade funcional e não uma oposição, por isso Reich entendia o termo “organismo” como a soma de corpo e mente.
Com base nas pesquisas do neurologista Paulo Mac Lean, desde 1952, sobre o cérebro triúnico humano (Navarro, 1996), este destaca que há uma trindade importante que suportará a função psíquica. Sendo assim, o Cérebro Reptiliano, se localiza nos núcleos da base onde residem as funções vitais e instintivas ligada à manifestação afetiva relacionada ao território, caça e, sexo, principalmente. Portanto, é um cérebro instintivo. Ao longo do desenvolvimento filogenético o Cérebro Reptiliano foi recoberto por outro cérebro, o Cérebro Límbico (extremidade, contorno). Este está presente nos animais vertebrados de sangue quente, que são os animais que cuidam da prole. Com esta evolução, o comportamento afetivo em relação ao sentir e experienciar se destaca com a memória afetiva, sentido de autoconservação e da atividade sexual ligada a uma descarga energética de prazer e não apenas de procriação, pois há uma conexão com os núcleos da base, com a hipófise e ao neocórtex. Esses dois cérebro chamados “animais” estão presentes no homem. Nessa trajetória humana de desenvolvimento, citando Navarro (1996, p. 19):
Após cerca de dois milhões de anos, a filogênese deu outro salto evolutivo, com o advento do neocórtex (neopallium), característico do homem e, em medida limitada, de alguns primatas (em particular, o chimpanzé). É o neocortex que permite a visão tridimensional, ligada à postura ereta, a partir da qual o homem é definido como um mamífero óptico (um terço das nossas vias nervosas pertencem aos olhos!).
O neocórtex é o terceiro cérebro proposto por Mac Lean, o Cérebro Cortical, que possibilita a dimensão espaço-temporal, da historicidade, da consciência, linguagem, abstração e a inventividade. A delicada e coerente integração e maturação destes três cérebros é que possibilita a saúde, pois determinam a formação do EU (Navarro, 1996) com uma inscrição no tempo, na cultura e no social. Consequentemente, quando há dificuldades nas etapas de desenvolvimento da fecundação à maturação total dos cérebros, é possível ocorrer psicopatologias diferenciadas. Como já sinalizado, quanto mais precoce ocorrer um problema, mais grave é a patologia.
A possibilidade de amadurecimento está pautada nas condições oferecidas/possíveis da “função materna” para a facilitação do desenvolvimento que proporcionará a carga energética desde o período fetal. Ou seja, é o campo energético materno (primeiro campo energético simbiótico) que facilitará o campo energético do embrião e do feto para avançar da simbiose biológica para chegar à simbiose psicológica e, depois, atingir a identidade/maturidade. Neste aspecto, ao fazer uma ligação das neurociências com a psicopatologia, destaca-se que:
... O desenvolvimento do Sistema Nervoso Vegetativo permite observar que, se no período embrionário o mecanismo de defesa contra o estresse nocivo é celular, no período fetal a resposta defensiva é mais complexa e mais específica. O feto defende-se do estresse (do medo!) ativando o sistema neurovegetativo do ortossimpático, que responde com uma hiper-secreção de adrenalina, com um mecanismo de contração de todo o organismo, de fechamento para o exterior, não havendo mobilidade ... . (NAVARRO, 1996 p. 19)
Nesta realidade fetal estressada por uma estimulação nociva constante, a resposta será contínua no sentido de sobrevivência apenas, onde será estimulado o cérebro reptiliano para esta função. Os prejuízos neste caso são graves quanto à psicopatologia. Os danos causados pelo estresse no período fetal podem comprometer a formação, alterando o funcionamento, pois neste período ocorre a formação do cérebro e do sistema neurovegetativo (Navarro, 1996). Já no final do período neonatal, com a preparação para a mastigação e o movimento voluntário por desenvolvimento de maior mielinização das fibras nervosas, a criança se preparar para explorar o mundo além de sua mãe e depende de uma maternagem satisfatória, caso contrário, a incerteza do afeto poderá levar ao Estado Limítrofe. Assim, para o entendimento das psicopatologias e a sexualidade, há a necessidade do estudo e reconhecimento da função do sistema neural, pois os fenômenos humanos estão entrelaçados pelos sistemas.
Entre os teóricos, a nosografia proposta por Bergeret (2006) destaca as Estruturas Neurótica, Estados Limítrofes e Estados Psicóticos. Navarro (1996) destaca Neurose, Psiconeurose, Borderline e Psicoses. Freud (1924), em sua clínica, aponta para neurose, psicose e perversão. Reich (1989) aborda principalmente as estruturas de caráter neurótico (o caráter histérico, o caráter fálico-narcisita, o caráter compulsivo e o caráter masoquista) e, na estrutura Psicótica, cita a Cisão Esquizofrênica. Escribano (2010) aponta pela visão psicossocionômica que há também estruturas de base como Neurose (histérico, obsessivo e passivo agressivo); Estados Limítrofes (borderline, narcisista e psicopata) e Estados Psicóticos (paranóia e esquizóide).
Na tentativa de uma relação com o DSM – V (2014) que é um manual da Associação Psiquiátrica Americana e aponta uma classificação categórica de transtornos (onde a palavra transtorno significa dar a volta além de, modificar algo de sua forma inicial/normal), no sentido estatístico e clínico. Como bem apontado pelos organizadores do DSM-V, a característica de transtornos mentais é a forma de distinguir dos transtornos físicos, embora sinalizado o dualismo como um problema na denominação cartesiana. Parece ser de grande importância entender o que aponta o DSM-V sobre a sintomatologia em relação a linguagem de estrutura de personalidade psicológica. A grande diferença, neste amplo campo de atuação médica psiquiátrica e psicológica sobre um mesmo fenômeno do sofrimento humano, é que para a psiquiatria o paciente está com um sintoma e ao ser suprimido este sintoma o paciente está de certa forma curado. Para a psicologia, o paciente é uma estrutura de personalidade que apresenta um sintoma e o fato dele não apresentar um sintoma não significa estar curado. Ou seja, para a psiquiatria o paciente está com um sintoma determinado (um transtorno) e, para a psicologia, o paciente é uma estrutura de personalidade psicodinâmica (uma subjetividade) que manifesta ou não um sintoma.
A proposta da etiologia das psicopatologias em uma visão psicodinâmica, segundo Navarro (1996) e expressa esse é, pode ser associada e entendida da seguinte forma: o resultado do estresse do medo embrionário gera a psicose, onde o sexo é uma resposta do cérebro reptiliano, é instintivo, não havendo uma sexualidade. No caso do estresse do medo fetal, que gera a psicose, há uma falta de identidade biológica do eu e a predominância é reptiliana com uma expressão de uma necessidade de uma fusão biológica. Já o estresse do medo no período neo-natal, que gera os estados limítrofes, a estimulação é córtico-reptiliano, com pseudos contatos, com nuance límbica que não respalda e nem assegura a vivência afetiva e a sexualidade. A psiconeurose, que tem a vivência do estresse do medo no período pós-natal, vive o medo da castração e a culpa, a afetividade e a sexualidade é vivenciada com base nos mecanismos de defesa. A neurose, cujo estresse do medo é circunstancial após a puberdade, pode acarretar na afetividade e sexualidade com dificuldade de assertividade em dado momento com certo comprometido pelo sentimento de alguma ansiedade.
Algumas características podem ser destacadas como:
A – Neurose
Em uma observação preliminar, a psiquiatria e a psicanálise parecem unificar o significado dos termos Neurose e Psiconeurose, contudo, Navarro (1996) destaca a importância da distinção apontada por Freud entre essas psicopatologias.
Destacado por Navarro (1996) a neurose é um estado menos comprometido, pois de um modo geral o contato consigo mesmo, com a realidade, com o outro e com a vivência da sexualidade é relativamente boa, não cria uma culpa imobilizadora. A sexualidade é vivida de forma mais tranquila seja na heterossexualidade ou homossexualidade, ou seja, se insere na normalidade aceitável. Esta estrutura é mais próxima da saúde, do caráter maduro ou caráter genital.
B – Psiconeurose
Uma característica desta psicopatologia é a vivência da angústia de castração e a culpa. Reich (1989) pontua que o “caráter neurótico” é a solução de um conflito sexual infantil. Esta organização está centrada no complexo de Édipo e sua problemática com a realidade. Para o entendimento desta construção, é preciso observar os mecanismos inconscientes presentes, a história da pessoa e a compreensão da dinâmica e da economia psíquica da pessoa em seu contexto. Assim, um modo típico de reagir transforma-se na maior dificuldade de intervir nas situações delicadas. É exatamente este modo típico de reação que as defesas estão “falando” de sua origem e do seu conflito, ou seja, se ancorados nas diferentes fases do desenvolvimento e tendo acionado Édipo como um complexo e dado um solução razoável. Desta forma, há a diferença entre os tipos de neuroses, pois a estruturação se deu em momentos diferentes na fase de desenvolvimento psicossexual/psicoafetivo. Navarro (1996) sinaliza a diferença entre a condição incestuosa (relação entre duas pessoas) e a condição edípica (relação entre três pessoas).
Nesta psicopatologia o ego se enrijecer como forma de defesa ao mundo ameaçador e castrador (ter sido privado de algo importante e fundamental afetivamente) introjetado e, nesse sentido, ocorre uma identificação com a principal pessoa que frustra; depois a criança reveste contra si mesmo as energias agressivas direcionadas contra a pessoa frustrante que gerou angústia e, finalmente, desenvolve formas de agir que irá contra os empenhos sexuais utilizando as próprias energias. Com esta estruturação, as cargas energéticas (que a colocaram em ameaça) que buscavam satisfação, agora, são transformadas em contenção. Ou seja, a energia dos empenhos sexuais (libido) é agora utilizada como uma energia para se defender dos próprios impulsos. Este processo resulta no medo de punição e por isso se endurece, formando uma forma típica de reação. Se o medo de punição é referente à fase anal, a conduta será de controle excessivo; se fálico, a conduta será a exibição narcísica, etc., mas tudo vinculado à principal pessoa frustrante, a que tem o peso da construção do Super-ego. Há uma diferença quantitativa nestes aspectos e é preciso analisar se essa forma de reação é muito rígida ou com alguma flexibilidade. Quanto maior a rigidez, maior o comprometimento. Vale ressaltar Reich (1989, p. 152) “uma personalidade cuja estrutura de caráter impede o estabelecimento de uma regulação de energia econômico-sexual é a condição prévia de uma doença neurótica futura.”
O quê na realidade difere uma psiconeurose de outra? A forma de reação (o caráter, o tipo de psiconeurose) de uma pessoa não depende do choque entre instinto e frustração, mas principalmente como aconteceu e a fase do desenvolvimento psicossexual demarcado. Especificamente, Reich (Op. Cit., p. 153) detalha como:
- a fase na qual o impulso é frustrado;
- a frequência e intensidade das frustrações, os impulsos contra os quais a frustração é principalmente dirigida;
- a correlação entre indulgência e frustração;
- o sexo da pessoa principalmente responsável pela frustração;
- as contradições nas próprias frustrações.
Este conteúdo proporciona uma leitura coerente do desenvolvimento da neurose e possibilita a identificação no momento em que a pessoa se apresenta com sua queixa. Assim o que deixa claro a característica de uma pessoa em sua forma de reagir não é o que ela evita nos impulsos, mas como ela evita.
Esse exemplo pode ser mais bem entendido quanto às formas de “caráter neurótico” circunscritas e descritas tipologicamente por Reich (1989):
B.1 – Histeria – Nesta psicopatologia o tipo de angústia refere-se à interdição sobre o desejo incestuoso. Talvez seja o tipo de neurose que mais expresse sua forma notável e transparente. O que é comum para ambos os sexos desta psicopatologia é a atitude sexual intensa, a agilidade física com sensualidade destilada que mostra uma sexualidade despertada cedo. As mulheres apresentam, de modo geral, um andar e falar sexualizado e provocante. Os homens apresentam uma delicadeza sedutora, tendem a uma cortesia exagerada e tem uma expressão no rosto e um comportamento infantilizado de maneira feminina. A sensualidade e sedução se apresentam com uma ansiedade nos momentos em que o objeto desejado (que aumenta a carga libidinal) e consequentemente aumenta as defesas, onde irá responder com recuo (negando), sendo agressivo ou passivo. Aparece, nas relações, uma excitação ou agitação que não corresponde à satisfação no ato. Tem facilidade para ser sugestionável e instável em suas decisões. Seu apego sexual de natureza infantil faz com que experimente as fantasias como realidade.
No momento do desenvolvimento psicoafetivo infantil, ocorreu uma fixação na fase genital com sentimentos incestuosos (que foram reprimidos) que resultou em uma forte agressão e angústia. Isso acarreta que todas as fases psicossexuais vividas sejam reenergizadas, ou seja, há uma sobrecarga de energia que excita o organismo e o aparelho psíquico como um todo, isto é, uma tensão sexual que não é gasta. Neste aspecto, Reich (1989, p. 193) destaca que:
... a sexualidade genital se coloca a serviço de sua própria defesa. Quanto mais a atitude como um todo é dominada pela angústia, mais urgentes parecem as manifestações sexuais. Em geral, o significado dessa função é o seguinte: o caráter histérico tem impulsos genitais excepcionalmente fortes e não satisfeitos, que estão inibidos pela angústia genital. ...
Além disso, na histeria, a pessoa não se reconhece tendo um comportamento sexualizado, pois a pessoa histérica se defende da sexualidade com a própria sexualidade, em função de sua angústia genital; fato que mostra que todo o investimento sexual é pura defesa (Reich, 1989). Somado à esta defesa pode aparecer variações entre o narcisismo ou comportamento de dominação, impressionabilidade (mecanismo fálico) e depressão (mecanismo oral). Uma outra característica desta psicopatologia é a genitalização intensa dos órgãos sexuais (de diversas formas) e o restante do organismo não participa desta sensação, ou seja, a libido (energia) está mal adaptada no organismo para atingir o seu fim, viver a sexualidade plenamente.
B.2 – Compulsivo – Esta psicopatologia destaca um sentido de ordem pedante em todas as coisas indiscriminadamente. Quando, por algum fato, este padrão é alterado, o sentimento desagradável e ansioso irrompe com base na angústia. É uma pessoa que tende a desenvolver seu trabalho de modo excelente e minucioso na fiscalização, auditoria, crítica etc..., contudo há a ausência de espontaneidade, é artificial e não criativo. Reich (1989, p 196) aponta que “quanto mais patológico e rígido é esse traço, mais a atenção se concentra nas coisas de importância secundária, negligenciando assuntos racionalmente mais importantes.”
O pedantismo, minúcia, indiferença, reserva são formas defensiva que tem sua base na energia do erotismo anal, pois são formações reativas históricas de controle sobre algo vivido como desagradável em relação à educação da higiene por volta dos dois a três anos de idade. O seu oposto também pode ocorrer, manifestações de total desleixo em todos os sentidos. Há uma inclinação para o sentimento de piedade e de culpa, sendo hostil e agressivo em alguns momentos. Externamente, esta psicopatologia revela reserva e autodomínio, contudo, internamente existe o oposto, a indecisão, a dúvida e a desconfiança intensa (esta última, extrema!). Isso o faz ser tanto mal-intencionado quanto inacessível afetivamente. É sereno em suas expressões de “amor” ou ódio sociais, mas é apenas uma manifestação para esconder seu interior – o controle.
Do ponto de vista clínico, observa-se uma fixação na fase anal com sadismo por volta dos dois ou três anos de idade, onde com base na personalidade da mãe e com o inicio do controle esfincteriano pela educação de higiene iniciada cedo demais, esta criança teve que corresponder às expectativas de alguém em que ela necessitava de seu amor. Teve que aprender a controlar algo para se sentir amada. Esta aprendizagem acarreta uma rígida obstinação anal e mobiliza o impulso sádico (raiva potencializada) e se arrasta, no desenvolvimento, até a ativação da fase fálica, onde os empenhos da libido deveriam passar para um estagio mais ativo. De um modo geral, a atitude dos pais é contra a sexualidade (castradora) e, ao ativar a falicidade, logo esse empenho é abandonado para retornar a fase anterior, anal, e aí se fixando.
Com a chegada à puberdade, onde naturalmente a sexualidade é mais carregada de energia pela própria maturação corporal, haverá dificuldade para lidar com esses impulsos em função do controle dos aspectos da analidade. Podem aparecer controles estéticos, éticos ou religiosos acentuados como modo de se justificar. O controle emocional é o que mais precisamente necessita ser escondido, protegido, ou seja, ideias separadas dos afetos.
Pode apresentar na vida sexual uma excitação genital de baixa carga, sem presença de envolvimento da sexualidade, pois os afetos são vividos como angústia, e esta angústia precisa ser evitada, controlada. É claro que o bloqueio afetivo revela uma contração do EGO, já que este não pode se expressar, e faz uso do aparato somático, em especial de toda a região pélvica, ombros e rosto (expressão de controle). Os impulsos contidos são os sádicos de morder, bater, pisar, esmagar, apertar, e uma forma de conter isso é a ritualidade. A ambivalência é uma tônica neste caso, pois há o impulso para amar e odiar a mesma pessoa. Todas as expressões de excitação viva e livre, que mobilize a genitalidade despertam os conflitos antigos não resolvidos resultando em uma angústia em que algo pode acontecer, o incontrolável, e que pode dificultar o restabelecimento do autodomínio (controle). Esta característica faz com que toda espontaneidade para a vivência da sexualidade e da vida seja comprometida.
B.3 – Passivo-feminino – Reich (1989) faz uma breve distinção entre a psicopatologia Neurose Passivo-feminino dentro da Neurose Compulsiva. O passivo-feminino evita a agressão e o confronto, mas de forma em que “a analidade atua na direção original como um empenho da libido de objeto” (p. 200). Ele se defende da agressão com a passividade, a entrega e a submissão passiva, o controle é obtido de forma passiva, servil e subserviente.
B.4 – Fálico-narcisista – O biotipo desta psicopatologia se caracteriza por uma compleição atlética, aspectos masculinos duros e com ar facial feminino. Dificilmente é servil, é arrogante, expressão de desdenho agressivo e um forte ar de exibição em um tipo atlético, com característica sádica relativa ou dissimulada. É comum lidar com as situações de vida de forma em que o ataque está presente em sua ação. O componente de autoconfiança, ou seja, o seu interesse por si mesmo, é bem marcado pela autoridade e exibição fálica (poder), porém com base afetiva infantil. A coragem agressiva cumpre uma função de defesa. Há uma boa potência eretiva, que se opõe à potencia orgástica, que os levam a uma atitude de menosprezo do objeto, embora as pessoas (homens ou mulheres) com esta psicopatologia sejam geralmente muito desejáveis pelas características bem marcada de masculinidade. A sexualidade pode ser expressa por homossexualidade ativa e excitabilidade clitoriana, bem como o prazer na vigorexia. Clinicamente, é importante observar a relação entre o ego como um todo e o falo, ou a fantasia de possuir um ou ser um falo (poder). No caso masculino, o pênis não é vivido como uma parte do corpo para o amor e sim para agredir, destruir e perfurar. Em situações onde esta autoconfiança é gravemente perturbada, a depressão profunda aparece.
A realidade fálica com o forte componente narcísico é um mecanismo defensivo e esconde os receios da possibilidade de retorno à fase anteriormente abandonada (analidade/passividade) ou ainda mais primitiva, a oralidade, onde há a tendência para o uso de drogas e/ou álcool que, de certa forma, minimizará os conflitos fálicos. Segundo Reich (1989) os crimes sexuais tendem a ser cometidos por este tipo de psicopatologia com base nas profundas decepções amorosas desde a infância (com o primeiro objeto de amor) e a estabilização de uma vingança fálico-narcisista sobre o objeto sexual, porém, com mais comprometimentos sobre o julgamento em algum momento.
B.5 – Masoquista – A nosografia e nosologia do caráter masoquista marcou o rompimento de Reich com a teoria freudiana. Ficou demonstrado por Reich na historia da patologia sexual que o traço masoquista é uma angústia de orgasmo onde não há um impulso que busca o sofrimento, mas sim um impulso secundário econômico-sexual como resultado da repressão de mecanismos sexuais naturais. Disse Reich (1989, p. 210) em 1932 “Por ora não é mais possível atribuir o sofrimento humano a uma imutável ‘vontade biológica de sofrer’, isto é, a um ‘instinto de morte’, mas a influências sociais funestas ao aparelho biopsiquico.”
O questionamento da veracidade do relato dos pacientes fez com que Reich pensasse no caminho do entendimento do masoquismo e verificou que o masoquista busca o prazer como qualquer outra pessoa, só que há um mecanismo que perturba e faz o masoquista perceber as sensações prazerosas como desprazer quando atingem certo nível de excitação. Assim como as outras psicopatologias psiconeuróticas, o masoquista é também uma forma de defesa do EGO pelo encouraçamento e, economicamente, a energia sexual elevada (libido) pela paralisação (estase energética) é gasta na forma deste tipo psicopatológico. Um traço típico é o sentimento constante de sofrer e de se queixar de tudo, infligir dor a si mesmo e se humilhar, além de uma grande paixão para atormentar pessoas próximas. Seu comportamento é sem movimento coerente, é desajeitado ou com alguns maneirismos em suas relações pessoais. Talvez seja comum encontrar na história desses pacientes os ataques prolongados de teimosia violenta, gritos e pontapés levando os adultos ao desespero e à raiva. Nesses casos os pais podem ameaçar e a criança cria uma fantasia de que algo muito grave e perigoso pode acontecer. Quando surge uma bronca, um castigou ou uma palmada, o alívio surge com este sofrimento, pois havia a espera de algo pior. Reich (1989, p. 222) aponta que:
a fantasia masoquista de apanhar constituía uma antecipação de castigo mais severo. (...) O masoquista chega à atividade agradável como qualquer outra pessoa, mas o medo de punição interpõe-se. A autopunição masoquista é a realização não do castigo temido, mas de um outro, substituto, mais suave. Assim, representa um tipo especial de defesa contra o castigo e a angústia.
É importante observar neste tipo de traço masoquista que há uma entrega passivo-feminina em relação à pessoa que castiga. Além disso, o masoquista “gosta” de provocar os objetos amados e de seu interesse o qual sofreu desapontamento (amor e frustração). Com um ar infantil, percebe que viver enfurecido não é possível e daí passa a testar o amor do outro. Mas as provocações e as irritações são uma forma de pedir amor, de forma desesperada, na verdade, forçar. Este é um comprometimento grave nas relações, pois de quem se deseja amor é exatamente quem se atormenta e daí vem o desapontamento constante deste traço: quanto mais ama, mais irrita o ser amado. Há uma experiência intensa do medo de ficar só na infância, por isso capta a simpatia pela infelicidade do seu sofrimento. Eroticamente, o masoquista tem uma sensibilidade especial pelo tato, a pele é um contato extremo. Destaca-se o “gostar” de receber beliscões, ser esfregados, chicoteados, amarrados e cera quente, como forma de suportar esta sensação e descarregar certa quantidade de energia, além de poder viver humilhações entre outros. O objetivo inicial não é sentir dor. Explica Reich:
Em termos de fisiologia da angústia, a contração dos vasos periféricos aumenta a angústia (palidez, no caso de susto; sensação de frio, no caso estado de angústia; arrepios provocados pelo medo etc.). Por outro lado, a sensação de pele quente, causada por um fluxo mais forte de sangue através dos vasos periféricos, é um atributo especifico do prazer. Fisiologicamente, a tensão interior é determinada pela restrição do fluxo de sangue. Por outro lado, o forte fluxo sanguíneo pela periferia do corpo alivia a tensão interior e, em conseqüência, a base fisiológica da angústia. Do ponto de vista fisiológico, o efeito liberador da angústia do orgasmo baseia-se essencialmente nesse processo, que representa uma modificação notável na circulação do sangue, com a dilatação dos vasos periféricos e a descarga da tensão no centro (vasos espâncnicos. (REICH, 1989, p.228)
A base erógena do masoquista então é o contato da pele, onde ocorre a vasodilatação da periferia do corpo que alivia a tensão angustiante. Assim, ele irrita a tal ponto até receber uma forma de resposta corporal agressiva para aliviar sua angústia. Inicialmente, seria “aqueça-me”, com a psicopatologização, transformou-se em “bata-me”. Para Reich, a estruturação demarca que
“A introdução à fase genital na infância através do exibicionismo, seguida imediatamente de grave frustração e repressão desse prazer e de completa inibição do desenvolvimento genital posterior, pertence especificamente, de acordo com minha experiência, ao caráter masoquista ... .”(Op. Cit, p. 231).
Frente aos elogios, a pessoa masoquista tende a ter dificuldade para lidar, tendendo a auto-depreciação e a auto-humilhação, pois falta um elemento narcísico. O elogio excita e traz a tona uma provocação das tendências exibicionistas (fálica) que foram fortemente reprimidas e gera angústia. A forma de minimizar essa excitação que cria angústia é auto-humilhação que o leva a sensação/realidade de abandono. Então, vale destacar que o masoquista demonstra e exige (não pede) amor de maneira muito sinuosa, ou seja, por queixa, provocação e infelicidade, isto é, distorce o amor desejado.
Como já destacado, toda psiconeurose tem sua base na dificuldade da satisfação plena da vida genital, pois há o conflito entre o desejo sexual e o medo de punição como fator central, fazendo com que a energia acumulada sustente a psicopatologia. Em sua dinâmica, o masoquista, a tentativa de eliminar a angustia faz com que ele se enterre muito mais no desprazer. Reich (1989) destaca:
O caráter masoquista baseia-se numa atitude espástica muito peculiar, que controla não apenas seu aparelho psíquico mas, primeiramente e a cima de tudo, o aparelho genital. Inibe imediatamente toda forte sensação de prazer e transforma-a em desprazer. Dessa maneira, o sofrimento, que é a base das reações de caráter masoquistas, alimenta-se continuamente e aumenta. (p. 235)
... o treinamento habitual de higiene (demasisado cedo e severo) leva o prazer anal a ter precedência sobre outras formas e a libido a fixar-se nessa fase. A ideia de apanhar, relacionada com a analidade, é definitivamente desprovida de prazer e, no começo, carregada de angústia. Assim, não é o desprazer de apanhar que se torna agradável. Antes, é o medo de apanhar que impede a sensação de prazer. Durante o desenvolvimento, esse medo é transferido para a zona genital. (p. 238)
... todo prazer que aumenta para além de uma certa medida inibe-se e torna-se desprazer. (p.239)
Assim, o que se pode perceber é que a angustia surge entre o instinto e o objeto, o que acarreta em que o prazer desejado seja percebido como perigo antecipado, isto é, em vez de viver o prazer, o desprazer é o resultado final do que foi investido no início. Inicialmente o objetivo é pensado e desejo como agradável, mas todo o investimento é atravessado e impedido pela frustração, pelo medo de punição ou angústia que acaba por modificar todo o objetivo, surgindo ou “restando” parecer desagradável.
As questões de impulso vinculados à analidade tem um intensidade menor que os impulsos genitais e, por isso, o masoquista tende à comportamento passivos de sofrimento do que de exibição, isto é, transformam o prazer em desprazer. Neste dado tão específico, cita Reich (1989):
... do ponto de vista econômico-sexual, a atitude masoquista e a fantasia relativa a ela provêm da percepção desagradável da sensação de prazer e servem para dominar o desprazer através da atitude psiquicamente formulada: ‘sou tão infeliz –ame-me!’ Então a fantasia de apanhar entra em ação, porque a necessidade de amor também contém reivindicações genitais que forçam o paciente a afastar o castigo para a parte de trás do corpo: ‘Bata-me, mas não me castre!’ ... (p. 241)
É observado que bater é menos grave que castrar, ou seja, o problema masoquista é uma perturbação especifica em relação a viver o prazer, pois ele não consegue viver uma grande excitação genital e, para castrar (o grande medo) é preciso tocar (excitar). Disso resulta a entrega passiva (bata-me!), expressando a condição de analidade. Apanhar representa o alivio substituto de algo percebido como mais perigoso, onde se houver um “orgasmo”, não foi por outra coisa senão pelo apanhar, além de que foi o outro quem causou. Especificamente, a necessidade de ser punido tem o propósito de viver um alivio de maneira indireta que pode ser responsabilizada ao outro punidor.
Citando Reich (1989, p. 242):
O significado do mecanismo: Ame-me e eu não terei medo.
O significado da queixa: Você é o responsável – não eu!
A função da fantasia de apanhar: Bata-me para que, sem me sentir culpado, eu possa aliviar-me!.
Assim, é importante entender que há um conteúdo do impulso (instinto), o conteúdo da repressão (representação da angústia e punição) e por onde –de que modo– o individuo tem o alívio (representação da satisfação, ou seja, o alivio é o objetivo do impulso instintivo.
Qualquer que seja a psiconeurose, é a angústia de castração e culpa que precisa ser liberada, sendo de forma coerente e em consonância com o biopsicossistema do paciente, com tempo adequado para elaboração da sua reestruturação.
C – Estados limítrofes
O nome limítrofe demarca uma realidade psicopatológica de limiar entre duas realidades, ou seja, não sendo psicótico e nem sendo neurótico. A nosologia da Neurose foi definida em 1777 e da psicose em 1845 (Bergeret, 2011) e, no caso da estrutura limítrofe, está situada entre estas duas psicopatologias. Há nesta estruturação psicopatológica uma organização de funcionamento psíquico à realidade de estar mais ou menos no limiar, com a vivência marcante da angústia de perda do amor (do objeto) ou a ameaça constante de perda, o que impossibilita a triangulação edípica, ou seja, não há uma representação edipiana, quer dizer, não chega a uma vivência afetiva de édipo, pois o risco afetivo mais forte/grave foi vivido anteriormente na relação de amamentação com a mãe. Esta estrutura é uma patologia do narcisismo, centrada na dependência anaclítica (apoiado sobre o outro, ser dependente do outro), ou seja, medo intenso de abandono. É um estado indeciso do EU, imensa necessidade afetiva, de atenção, compreensão, sendo sedutor, disponível e adaptável, com uma luta sem fim contra à depressão que se coloca em atividade constante. É uma vivência demarcada no período de amamentação, período de desmame e desmame propriamente dita. Os subtipos são:
C.1 – Borderline – características psicológicas na fronteira entre a psicose e a psiconeurose. Navarro (1996) faz uma crítica a esta colocação ao destacar como inadequada, pois os mecanismos psicóticos são diferentes dos mecanismos psiconeuróticos e é possível encontrar as duas realidades na mesma pessoa. E neste caso, é definido por ele como uma cobertura. O borderline é um distímico e, segundo Navarro (1996, p. 46), “distimia significa distúrbio do equilíbrio emocional, que provoca alterações do humor, isto é, da tonalidade afetiva de base, que é temperamental.” Destaca que há neste caso uma lesão narcísica, um sentimento de perda grave que acarreta nas explosões emocionais.
Nesta estrutura, o período neonatal é a base, pois é um período simbiótico (dependência afetiva) marcado pela amamentação inadequada ou deficitária, período de desmame e desmame propriamente vividos inadequadamente. Este momento é fundamental e delicado (sensível) para o recém nascido para deixar a simbiose, onde a separação deve ser gradual, caso contrario a sensação do abandono é feroz. Com esta vivência, o outro é visto e sentido como objeto e não como sujeito. A realidade materna ou a função materna é, neste caso, de extrema importância, pois a mãe foi inconstante. Foi vivido um abandono e para não sofrer, introjeta a mãe como boa e má ao mesmo tempo, onde ele só existe se a mãe está.
As explosões do borderline são reativas às condições de existência da ameaça de perder ou separação afetiva. O borderline é um ser que sente que precisa ser “amamentado” (ser maternado) na vida adulta e expressa uma sintomatologia de abandono, tristeza, ideia de culpa, auto-acusação, indignidade e decadência. Contudo, vive a vida de forma apaixonada e intensa quando não está em crise ou em suas oscilações. Pode apresentar ansiedade, resignação, estupor, agitação, falta de apetite com problemas digestivos, insônia, impotência sexual e alterações menstruais. Pode ir da euforia à fuga de ideias, se tornar agressivo e agitado, porém, com acompanhamento do afeto. As explosões acontecem quando há um refluxo energético para cima, do oral para o ocular, podendo surgir crises epilépticas. O borderline em contato com o bom objeto tende a ser entusiasta e implicado com as atividades, porém, quando em contato com objetos maus, é violento, impulsivo, confuso e pode “delirar”. Seus conflitos são vivenciados de forma no tudo ou nada e sua comunicação é paralela, de duplo fundo.
C.2 – Narcisista – As características que marcam esta estrutura de personalidade, segundo Escribano (2014), é um sujeito que exige constante admiração e atenção, tem sentimentos de ter direito sobre alguma coisa que, embora não tenha feito ou investido para um reconhecimento devido, quando não recebe este reconhecimento, há um comportamento de cólera ou explosão afetiva. Há também a incapacidade de considerar que o sentimento do outro seja diferente do seu. Em geral são pessoas charmosas e se vestem bem, falam bem sobre si mesmo e são entusiastas. Suas fantasias se voltam pela preocupação de seu sucesso, sem limites, o seu amplo poder, a beleza e o amor ideal, oscilando entre o valor próprio e o desvalor do outro. São ambiciosos, exagerados e egocêntricos. Os narcisistas tem em si o bom objeto, sendo ele próprio bom. Seu sofrimento se manifesta quando o mundo não o satisfaz como ele deseja. Como não sabe lidar com a frustração, acusa e pede ao outro como deve agir ou que mude para atendê-lo melhor. Muitas vezes isso ocorre por estratégias. Um Narcisista sofre tal como um Borderline da clivagem do ego, porém, tende a ter em si o bom objeto e, por último, o mau objeto de amor, que se defender da angústia anaclítica. Espera que o outro venha trazer para si a boa satisfação e imagem de si mesmo. Tem dificuldade de viver o “nós”, usando mais o “eu”. Estes sujeitos narcisistas tiveram um registo estrutural de sua subjetividade de uma mãe muito ansiosa em sua construção de personalidade no período total de amamentação.
C.3 – Psicopata – Características gerais de uma pessoa ativa, eficaz, intuitiva e inteligente, onde gosta muito de situações onde tenha desafios e riscos a correr em que buscam oportunidades. São facilmente adaptáveis a situações novas e dificilmente expressam emoções que possam impedir de obter êxito a não ser a de grande sedução, embora superficial. Tem necessidade de excitação. Do ponto de vista patológico de sua personalidade, há certa impulsividade, imaturidade afetiva, procuram constantemente excitações em que possa viver desafios impossíveis e que provoque a raiva dos outros. No fundo, são insociáveis, manipuladores e egocêntricos, pois intentam tirar proveito de todas as situações. São solitários por ter dificuldade de criar laços afetivos, já que o outro é um objeto de satisfação e não um sujeito com desejos diferente ou igual ao seu para uma troca. Neste sentido, o outro como objeto também pode ser um frustrador de satisfação. Não apresentam ter consciência de tais consequências de suas ações. Agem como estrategistas para obter o que ‘necessitam’. Este tipo de personalidade não tem um sistema de valores, pois a lei introjetada é deficiente ou inexistente. Funciona a partir de suas necessidades de satisfação de infância muito tenra. Ele está estruturado com um radar em que busca as oportunidades em que pode tirar proveitos.
Em sua história de construção de personalidade, viveu a experiência afetiva de uma mãe e um pai que foram incoerentes em seu dia a dia e que não lhe conferiram segurança e a sensação de perder foi constante. O mundo, neste ângulo, é perigoso, onde se pode perder sempre, inseguro, não se podendo confiar. Desta forma, irá se adaptar a cada situação isoladamente, sem história afetiva nem realidade passada ou futura, apenas no presente para se satisfazer ou tirar proveito. Expressará uma vivência oportunista ao invés de uma atitude moral. Com tal característica marcada, o tempo esta congelado no “aqui e agora” onde o passado não é importante e nem o futuro, e por isso não faz planos ou projetos de futuro e, portanto, seus atos não importam em relação à consequência (Escribano, 2014). Do ponto de vista psicodinâmico, o psicopata sofre e faz sofrer a sociedade, seja nos subtipos homicida (os que matam diretamente) e o organizacional ou camaleônico (os que matam indiretamente), a psicogênese parece ser a mesma. Esta estrutura apresenta uma tentativa de preencher seu vazio interior por uma forma criativa de coerção, para ter condições de poder, isto é, ‘preencher-se’ usurpando a força/desejo alheio e acaba por absorver/tirar o que é do outro ou produzido pelo outro ou, de posse do outro (Navarro, 1996).
D – Estados das psicoses
É importante marcar a diferença entre psicoses orgânicas e endógenas. As orgânicas são as que tem uma origem evolutiva do cérebro por inflamações, intoxicações e processos degenerativos. As endógenas demarcam uma origem no período embrionário e/ou fetal até o décimo dia de nascido, por restrição de livre fluxo de energia por um útero espástico do ponto de vista afetivo materno que ocasiona um quadro de esquizofrenia. Há também a psicose de origem no período neonatal. O estresse materno é ponto fundamental neste processo (Navarro, 1996). A vivência de ‘frustração’ muito precoce dificulta o entendimento e o nível de elaboração psíquica da vida afetiva futura, onde o conflito está entre a realidade e as necessidades pulsionais. A angústia vivida é a de se despedaçar, quebrar ou desmanchar e sumir. Segundo Bergeret (2011) esta estrutura psicopatológica tem sua organização como uma falha no narcisismo primário desde os primeiros instantes da vida, onde a criança se “sente” como um objeto não separado de sua mãe. Esta construção demarca uma relação complexa onde ocorreu uma relação de uma mãe tóxica do ponto de vista afetivo (Bergeret, Op. Cit.). Há um nível de frustrações e fixações muito precoces que resultam em uma poda da realidade onde o sujeito está fechado em seu mundo interior e sua tentativa de contato com o mundo exterior surge como delírio, um mundo paralelo. Nestes casos, o ego nunca está completo, mas sim fragmentado, podendo ser aparente ou não. A angústia profunda está centrada na fragmentação, na destruição, no estilhaçamento do pouco que lhe resta. O conflito está pela ameaça da realidade, lançando mão de defesas como a projeção, recusa da realidade que levam ao desdobramento da realidade e da personalidade, ou seja, a desrealização (Bergeret, 1998).
D.1 - Esquizofrenia – O termo ‘esquizofrenia’ foi destacado por Bleuler para substituir a ‘demência precoce’ (Navarro, 1996). Entre as estruturas psicóticas, esta se situa em uma posição mais regressiva no sentido libidinal e do desenvolvimento egóico. Essa etiologia tem um marco muito primitivo do desenvolvimento, demarcado como um papel severo com a matriz (mãe) que tem como traços afetivos o autoritarismo, superproteção, muito ansiosa e culpabilizada que comprometem a relação afetiva com o bebê sendo no fim fria e dependente deste filho para que ela possa se sentir existindo, ou seja, manutenção de seu próprio ego (Bergeret, 1998). Como destaca Escribano (2014), definida por M. Hanus e C. le Guillon como uma psicose grave que se caracteriza por uma transformação profunda e progressiva da personalidade com uma paralisação do contato com a realidade e se perde no caos imaginário. Pode ocorrer em uma forma negativa com síndrome dissociativa que envolve ambivalência nas relações de objeto; com bizarrice de ideias e atos; ou também a impenetrabilidade onde vive a impressão de que ninguém tem contato com ele. Já em uma forma positiva com delírios do “eu” ocorre com formas múltiplas, com alucinações onde pouco compreende das ilusões, intuições e interpretações (patologia perceptiva) não sistematizados e sem lógica e expresso em uma linguagem abstrata e simbólica. A esquizofrenia pode surgir com ideias delirantes, manifestações maníaco-depressivas e com forma médico-legais. Clinicamente, as forma da esquizofrenia são:
Esquizofrenia simples – Síndrome de dissociação, porém, atenuada. Presença do abandono gradual da iniciativa e com distanciamento da vida afetiva e da realidade (Navarro, 1996).
Hebefrenia – Síndrome dissociativa mais forte, porém as ideias delirantes são raras. Há comportamento inconsequente, infantil, evasivo e incoerente (Navarro, 1996). A defesa maior é a regressão a estágios mais ‘seguros’ ou fantasiados como seguros afetivamente.
Hebefrenia catatônica – Prevalece grave distanciamento da realidade pela imobilidade severa ou agitação (Navarro, 1996). Associado a problemas psíquicos e motores, sendo estes os maneirismos, os estereótipos, a passividade, a negatividade, o estupor, o furor, a impulsão e a catalepsia. Mediante o conflito angustiante, há a paralização motora como defesa.
Paranóide – Etimologicamente, paranoia de para-nous, se refere ao “espírito voltado contra”, ou seja, indivíduos que não suportam. Assim, são apaixonados, temíveis, apaixonantes ou com um desejo de onipotência. Esta é uma estrutura menos regressiva em relação ao desenvolvimento libidinal, tendo marcado uma fixação pré-genital, mas com alguma preponderância anal, onde se iniciaria um ego primitivo. É a forma mais completa de esquizofrenia, pois agrupa a síndrome de dissociação e delírio paranoide. Utiliza-se do mecanismo de projeção como defesa. A manifestação ocorre de forma linear do pensamento, utilizando de uma única ideia por vez onde se apega a ela com obstinação e firmeza, o que parece revelar a característica da fixação na analidade em seu desenvolvimento. O acaso ou incerto é extremamente ansiogênico, por isso, sendo obstinado e inabalável no que “pensa”, é característico no que pensa ser lógico e ser a lei que, acaba por irritar as pessoas. Como ele tem certa pobreza em fantasiar/fantasmas, necessita do outro para fantasiar em seu lugar, o que faz uso com o mecanismo da projeção, caracterizado pelo sentimento de perseguição e que significa um arranjo médio entre sua solidão e intimidade em relação ao seu objeto de desejo. A megalomania e o ímpeto de confronto são remanejados pelos limites ou fracassos que ‘justificam’ a distância. A defesa se estabelece contra os desejos passivos (anal) relativo à mãe e depois ao pai (Bergeret, 1998).
Heboidofrenia – é a forma psicopática da esquizofrenia, onde estão os sujeitos marcados por roubos, crimes e serial killer (Escribano, 2014). Segundo Dalgalarrondo e Vilela (s/d) a heboidofrenia ou heboide, termo criado por Kahlbaum em 1890, as alterações ocorrem na esfera das relações sociais e de personalidade, com alterações na esfera instintiva, distúrbios da compreensão das regras morais e dos hábitos culturais.
D.2 – Melancólico – K. Abraham foi o primeiro a estudar os mecanismos do luto em relação aos mecanismos da melancolia. Nas duas situações há a perda do objeto, porém, na melancolia a hostilidade vivida em relação ao objeto perdido está voltada agora contra o próprio sujeito. Ou seja, a pessoa perdida era incorporada ao sujeito, isto é, um aspecto emocional oral (incorporar). Esta ocupa um lugar entre a esquizofrênica e a paranóide. Caracterizado por aspectos depressivos autenticamente psicóticos. Expressa uma demanda excessiva de amor e uma tentativa de evitar ser punido; uma ambiguidade. Na melancolia, o sujeito tenta (re)encontrar o caminho do objeto de amor perdido e introjetado. Há neste caso a angústia de fragmentação por perder o objeto amado e odiado e que por isso nega a realidade (Bergeret, 1998). Caracterizada pela sensação de vazio interior, difere da depressão em função de que esta é caracterizada pela sensação de perda. Tem sua base no vazio neonatal que comprometeu a sensação de sobrevivência suficiente, acarretando na ausência de “ser” (Navarro, 1996).
D.3 – Autismo – Para Navarro (1996), o autismo é uma psicopatologia de condição estável, grave e de origem embrionária. Há baixa energia para o contato, sendo esta mais utilizada pelo cérebro reptiliano como manutenção da vida do que no sistema límbico e neocórtex. Há manifestações de inacessibilidade de contato, solidão, falta de relação afetiva, repetição de jogos e movimento que se impedido causa reações de raiva, movimento ritmados, ecolalia, dificuldade na linguagem, além de um apego fusional ao corpo do adulto. Em geral se observa pais frios e mecânicos do ponto de vista afetivo.
Longe de esgotar toda discussão sobre o tema, para finalizar esta reflexão, vale ressaltar sobre um ponto não destacado que se refere ao “tipo perverso”. Para a psicanálise freudiana, há destaques para os tipos psicose, neurose e perversão, porém, a perversão não seria uma estrutura de personalidade e sim um sintoma que pode aparecer em qualquer tipo das estruturas abordadas. Assim, a perversão é uma classificação para a psicanálise e não para a psicopatologia e que impropriamente também é chamada de estrutura pela psiquiatria (Bergeret, 1998).
Considerações finais
A formação do psicólogo deve ter uma sistematização para buscar a semântica da vida e das relações pelo processo de reconstrução pela psicoterapia e/ou a leitura dos fenômenos de vida. Além do estudo acadêmico formal, o longo trainning pessoal deve ser constante com supervisão, psicoterapia pessoal e estudos de grupo. Os estudos e o trabalho psicológico pessoal possibilitarão o entendimento e a valorização do próprio processo desenvolvimental, pois há a necessidade de viver em si a compreensão de seu significado para lidar com o outro. Do ponto de vista da formação, o estudo da psicopatologia precisa de um bom conhecimento de psicologia do desenvolvimento e, do ponto de vista pessoal, todo esse conhecimento precisa fazer sentido em sua história pessoal nos aspectos específicos e cruciais. Assim, a formação de um psicólogo é também o estudo do fenômeno pelo próprio fenômeno vivido, a busca do sentido do teórico em si. O sintoma, como visto nas estruturas de personalidade, expressa a própria história, é o como cada ser expressa sua história subjetiva construída, portanto, sua estrutura de personalidade, é um fenômeno. Do ponto de vista proposto pelo atual DSM V, o sintoma precisa ser retirado ou atenuado e isto torna o sujeito ‘curado’. É um manual que classifica e descreve o transtorno para reconhecimento diagnóstico e intervenção medicamentosa em saúde mental, principalmente. É preciso valorizar a intervenção medicamentosa pelo médico psiquiatra, uma vez que o psicólogo não tem esta habilitação. Da mesma forma que é por meio desta intervenção médica que o sujeito sai de uma crise, seja aguda ou nos casos graves. Contudo, pensar na estrutura é o fator psicodinâmico que busca na história pessoal para a possibilidade de reconstrução individual.
Os teóricos comentados como Freud, Reich, Navarro, Bergeret e Escribano destacam em sua visão uma base psicodinâmica para a compreensão das psicopatologias a partir da estrutura de base de personalidade que são de importância ímpar na formação do psicólogo. Assim, vale ressaltar que a psiquê tem a característica da expressão emocional e, para tanto, o afeto deve ser colocado nesta expressão com conteúdo e coerência para atingir a satisfação. Este afeto só pode ser assim expresso por meio do que foi construído e armazenado ao longo do crescimento e do desenvolvimento na vida. Destacou-se que os problemas vividos e marcados no período de um tempo e com certa intensidade durante o desenvolvimento psíquico dificultam o processo e causam um sofrimento que tem por base a estrutura de personalidade. Um sintoma psicopatológico é uma resposta de uma tentativa adaptativa, é um sinal de uma estrutura. Em uma análise, é preciso refletir que o transtorno focado na psiquiatria demonstra o sujeito que está com determinado sofrimento, enquanto que na psicologia o sujeito é determinada estrutura de personalidade que expressa um sofrimento. O diálogo entre a psiquiatria e a psicologia é de importância singular para se pensar no processo individual de cada ser com problemas. É preciso que o estudante e o profissional em psicologia saibam da linguagem do DSM V e possa fazer o diálogo com a psicopatologia com base nas estruturas de personalidade de base. É preciso dialogar com os pares, com a multidisciplinaridade das ciências para se obter uma interdisciplinaridade. Tal diferença para o formando em psicologia demarca sua conduta diferenciada para intervenção no processo psicoterapêutico.
Estruturas |
Tipos |
Instância dominante na organização |
Natureza do conflito |
Natureza da angústia |
Principais defesas |
Relação de objeto |
NEURÓTICA |
Neurose |
Ego |
Superego |
existencial |
- |
Genital |
PSICO NEURÓTICA |
Histérico Fálico narcisista Compulsivo Passivo- agressivo Masoquista
|
Superego |
Superego com o id |
castração |
Recalcamento |
Genital |
ESTADOS LIMÍTROFES |
Borderline Narcisista Psicopata |
Ideal de ego |
Ideal de ego com id e realidade
|
perda do objeto |
Clivagem dos objetos foraclusão |
Anaclítica |
ESTADOS DAS PSICOSES |
Paranóia Esquisoidia Melancolia Autismo |
Id |
Id com a realidade |
fragmentação |
Negação da realidade Desdobra- mento |
Fusional
|
Referências
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